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Antero Coelho

Uma foto vale mil palavras?

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...um editor que não usasse aquela imagem não teria publicado uma fotografia de Jesus crucificado.

ALGUÉM já disse que para explicar uma situação, não. Mas é inegável a sua tremenda força em transmitir emoções. E para mim pessoalmente, a capacidade de transmitir emoções é o caracteriza qualquer tipo de arte. Mas devemos concordar que uma imagem em movimento permite uma serie de recursos que facilitam essa capacidade de transmitir todas as emoções, enquanto que uma fotografia tem que transmitir todas as emoções e informações congeladas em um instante de tempo, uma fração finita do tempo infinito do universo. Não é a toa que a televisão e o cinema quando querem ressaltar um momento, paralisam na tela um determinado quadro de uma seqüência em movimento.

VOCÊ PODERIA dizer! Mas nem todos os tipos de fotografia são arte! É claro que são. Até mesmo o FOTOJORNALISMO. Existem emoções maiores que as transmitidas pela fotos de uma guerra ou de uma Olimpíada, ou ainda de um nascimento? NÃO, não existem. E volto a dizer, transmitir emoções é fazer arte. Ai você diria. Mas o fotojornalista tem que ter a sorte de estar no lugar certo e na hora certa, e apenas registrar o momento! Certo. Concordo com você. Do mesmo modo que RENOIR teve sorte de estar no "ALMOÇO DOS REMADORES", 1881, do mesmo modo que VAN GOGH teve a sorte de estar no "CAIS DO PORTO DE ANVERS" em dezembro de 1885, e do mesmo modo que eles e muitos outros tiveram a sorte de terem nascido gênios. Gênios que como eles e muitos fotojornalistas tiveram a necessária genialidade para captar um momento da historia ou mesmo do cotidiano humano.

No fotojornalismo há centenas de exemplos -o que terá sentido o fotografo MALCOM BROWNE ao ver o monge budista atear fogo as próprias vestes em uma rua de Saigon? Ninguém pode saber! O certo é que teve algo que o fez transcender os limites do homem e poder registrar o momento. Na época a foto gerou tanta celeuma que a questão de publicá-la ou não foi levantada na SOCIEDADE AMERICANA DE EDITORES DE JORNAIS e segundo o editor do jornal de Syracusa um editor que não usasse aquela imagem não teria publicado uma fotografia de Jesus crucificado. Essa capacidade de gerar emoções contrarias é que me fascina na fotografia. Poucas artes conseguem o mesmo efeito. É muito difícil ficar indiferente a uma imagem fotografada.

O ser humano tem mania de acreditar no que vê, e somente aquilo que acreditamos pode vir a se tornar tema de discussão publica. Temos também uma carga emocional tremenda por trás da câmara ou do pincel, como o caso de VAN GOGH que cortou a orelha que não conseguia retratar com perfeição. No caso do fotojornalismo as vezes a imparcialidade profissional é uma carga que pode vergar os ombros. Quando cinco jornalistas foram metralhados pelos Vietcongues em Maio de 1968, CHARLES EGGLESTON, o fotografo da UPI, não pode suportar mais. Saiu um dia com uma arma na mão e nunca mais voltou. Por tudo isso sempre achei que uma obra de arte não precisa ser explicada nem questionada, ela se explica sozinha. E qualquer questão que ela possa levantar vai ter um cunho pessoal e por isso não vai necessariamente representar a opinião da maioria. E no caso da FOTOGRAFIA, ELA VALE MIL PALAVRAS.

Antero Coelho, fótografo em Fortaleza
publicado na revista AVANT-PREMIERE, ano I, Nº 01 - Julho 1992