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Directo ao discurso

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Dr. Discurso Directo - Sai da frente, quero ficar sozinho na fotografia, ouviste?

Dr. Discurso Indirecto - És mesmo muito vaidoso. E egoísta, também; até nas fotografias se nota esse teu asco pela partilha.
DD – Nada disso. Não gosto é de emplastros. Eu sei que a tua profissão é narrar, é contares o que os outros viveram ou sofreram, e até desempenhas bem o teu trabalho. Isso não impede que te possam considerar um intrometido.
DI – Como assim? Olha que me estás a ofender…
DD – Era o que mais faltava! És um intrometido, sim, colocas-te entre a vida em directo, entre a vida como é ela é, e consegues tirar-lhe o brilho, o ritmo, empastelas os factos com a tua narração despicienda. És névoa que empalidece o vigor da prosa, és espelho baço, qual bengala de falso cego…
DI – Estás aqui, estás a chamar-me ditador, queres ver?
DD – Lembraste bem. Também o és, quando te arvoras no direito de conduzir as prosas genuinamente arrancadas à vida fora do texto, e que deviam chegar aqui, à Cidade das Palavras Escritas em que vivemos, no seu estado mais puro, sem filtros, sem intermediários…
DI – Que belo manifesto anti-capitalista! Em suma, o teu paleio vem comprovar aquilo de que sempre suspeitei, então essa dos “intermediários” tira-me todas as dúvidas. Por mais que queiras, não consegues desamarrar-te de vez do teu passado na extrema-esquerda.
DD – Tu a dares-lhe e a razão a fugir-te, primo. Eu sei que os intermediários fazem falta para algumas coisas, um exército deles para as bananas da Colômbia chegarem até nós. Mas para que preciso eu deles quando estou aqui nas Hortas, em Moçâmedes, a gozar belas férias à sombra das bananeiras? Estás a vê-las? É só esticar o bracinho e zás, mais uma para o bucho.
DI – E a casca?
DD – Pois é verdade, esquecia-me desse pormenor, tenho que lhes tirar a casca. Bela maneira de pormos um ponto final na conversa, que se faz tarde. Se permites a analogia, tu, priminho Discurso Indirecto, és a casca, e eu sou a Banana.
Não leves a mal, que eu gosto muito de ti.
DI – Tudo bem. Vou pensar no que acabas de me dizer. Às tantas retomo mas é os estudos, a ver se acabo o curso de torneiro mecânico; depois já podemos falar da bola, de miúdas giras, da incompetência dos políticos, em vez destas coisas indigestas. Passa bem!
DD – Tchau, Didinho. Vê lá bem isso, não te precipites. Lê primeiro os artigos que acabei de te enviar por e-mail e, se precisares, voltamos a conversar amanhã. Na caixa dos “relacionados” encontras mais. Beijinhos à Dora e aos meninos…

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